Quando olho o atual cenário da igreja evangélica brasileira
– estou usando o termo “evangélica” de maneira ampla – confesso que me sinto
incapaz de prever o que vem pela frente. Há muitas e diferentes forças em
operação em nosso meio hoje, boa parte delas conflitantes e opostas. Olho para
frente e não consigo perceber um padrão, uma indicação que seja, do futuro da
igreja.
Há, em primeiro lugar, o crescimento das seitas
neopentecostais. Embora estatísticas recentes tenham apontado para uma queda na
membresia de seitas como a Universal do Reino do Deus, outras estão surgindo no
lugar, como na lenda grega da Hidra de Lerna, monstro de sete cabeças que se
regeneravam quando cortadas. A enorme quantidade de adeptos destes movimentos
que pregam prosperidade, cura, libertação e solução imediata para os problemas
pessoais acaba moldando a imagem pública dos evangélicos e a percepção que o
restante do Brasil tem de nós. Na África do Sul conheci uma seita que mistura
pontos da fé cristã com pontos das religiões africanas, um sincretismo que
acaba por tornar irreconhecível qualquer traço de cristianismo restante. Temo
que a continuar o crescimento das seitas neopentecostais e seus desvios cada
vez maiores do cristianismo histórico, poderemos ter uma nova religião
sincrética no Brasil, uma seita que mistura traços de cristianismo com
elementos de religiões afro-brasileiras, teologia da prosperidade e batalha
espiritual em pouquíssimo tempo.
Depois há o movimento “gospel”, que recentemente mostrou sua
popularidade ao ter o festival “Promessas” veiculado pela emissora de maior
audiência do país. Não me preocupa tanto o fato de que a Rede Globo exibiu o
show, mas a mensagem que foi passada ali. A teologia gospel confunde “adoração”
com pregação, exalta o louvor como o principal elemento do culto público,
anuncia um evangelho que não chama pecadores e crentes ao arrependimento e
mudança de vida, que promete vitórias mediante o louvor e a declaração de
frases de efeito e que ignora boa parte do que a Bíblia ensina sobre humildade,
modéstia, sobriedade e separação do mundo. Para muitos jovens, os shows gospel
viraram a única forma de culto que conhecem, com pouca Bíblia e quase nenhum
discipulado. O impacto negativo da superficialidade deste movimento se fará
sentir nesta próxima geração, especialmente na incapacidade de impedir a
entrada de falsos ensinamentos e doutrinas erradas.
Em Brasília, temos os deputados e senadores evangélicos que,
gostemos ou não, têm conseguido retardar e mesmo impedir as tentativas de
grupos ativistas LGTB de impor leis como o famigerado PL 122. O lado
preocupante é que eles “representam” os evangélicos nestes assuntos e acabam,
por associação, nos representando de maneira generalizada diante do grande
público e da grande mídia. Por um lado, lamento que foram líderes de seitas
neopentecostais e pastores de teologia e práticas duvidosas, em sua maioria,
que conseguiram alcançar uma posição de destaque a ponto de serem ouvidos em
Brasília. Esta é uma posição que deveria ter sido ocupada pelos reformados,
como aconteceu em outros países. Mas, falhamos. E a bem da justiça, não posso
deixar de reconhecer que Deus usa quem Ele quer para refrear, ainda que por
algum tempo, a rápida deterioração da nossa sociedade. O que isto representará
no futuro, é incerto.
Notemos ainda o rápido crescimento do calvinismo, não nas
igrejas históricas, mas fora delas, no meio pentecostal. Não são poucos os
pentecostais que têm descoberto a teologia reformada – particularmente as
doutrinas da graça, os cinco slogans (“solas”) e os chamados cinco pontos do
calvinismo. Boa parte destes tem tentado preservar algumas idéias e práticas
características do pentecostalismo, como a contemporaneidade dos dons de
línguas, profecia e milagres e um culto mais informal, além de uma escatologia
dispensacionalista. Outros têm entendido – corretamente – que a teologia
reformada inevitavelmente cobra pedágio também nestas áreas e já passaram para
a reforma completa. Mas o tipo de movimento, igrejas ou denominações
resultantes desta surpreendente integração ainda não é previsível. O que existe
de mais próximo é o movimento neocalvinista, mas este é por demais vinculado à
cultura americana para ser reproduzido com sucesso aqui, sem adaptações. Estou
curioso para ver o que vai dar este cruzamento de soteriologia calvinista com
pneumatologia pentecostal.
O impacto das mídias sociais também não pode ser ignorado. E
há também o número crescente de desigrejados, que aumenta na mesma proporção da
apropriação das mídias sociais pelos evangélicos. Com a possibilidade de se
ouvir sermões, fazer estudos e cursos de teologia online, além de bate-papo e
discipulado pela internet, aumenta o número de pessoas que se dizem evangélicas
mas que não se congregam em uma igreja local. São cristãos virtuais que
“freqüentam” igrejas virtuais e têm comunhão virtual com pessoas que nunca
realmente chegam a conhecer. Admito o benefício da tecnologia em favor do
Reino. Eu mesmo sou professor há quinze anos de um curso de teologia online e
sei a benção que pode ser. Mas, não há substituto para a igreja local, para a
comunhão real com os santos, para a celebração da Ceia e do batismo, para a
oração conjunta, para a leitura em uníssono das Escrituras e para a recitação
em conjunto da oração do Pai Nosso, dos Dez Mandamentos. Isto não dá para fazer
pela internet. Uma igreja virtual composta de desigrejados não será forte o
suficiente em tempos de perseguição.
Eu poderia ainda mencionar a influência do liberalismo
teológico, que tem aberto picadas nas igrejas históricas e pentecostais e a
falta de maior rapidez e eficiência das igrejas históricas em retomar o
crescimento numérico, aproveitando o momento extremamente oportuno no país.
Afinal, o cristianismo tem experimentado um crescimento fenomenal no chamado
Sul Global, do qual o Brasil faz parte.
Algumas coisas me ocorrem diante deste quadro, quando tento
organizar minha cabeça e entender o que se passa.
1 – Historicamente, as igrejas cristãs em todos os lugares
aqui neste mundo atravessaram períodos de grande confusão, aridez e decadência
espiritual. Depois, ergueram-se e experimentaram períodos de grande
efervescência e eficácia espiritual, chegando a mudar países. Pode ser que
estejamos a caminho do fundo do poço, mas não perderemos a esperança. A
promessa de Jesus quanto à Sua Igreja (Mateus 16:18) e a história dos
avivamentos espirituais nos dão confiança.
2 – Apesar de toda a mistura de erro e verdade que
testemunhamos na sincretização cada vez maior das igrejas, é inegável que Deus
tem agido salvadoramente e não são poucos os que têm sido chamados das trevas
para a luz, regenerados e justificados mediante a fé em Cristo Jesus, apesar
das ênfases erradas, das distorções doutrinárias e da negligência das grandes
doutrinas da graça. Ainda assim, parece que o Espírito Santo se compraz em usar
o mínimo de verdade que encontra, mesmo em igrejas com pouca luz, na salvação
dos eleitos. Não digo isto para justificar o erro. É apenas uma constatação da
misericórdia de Deus e da nossa corrupção. Se a salvação fosse pela precisão
doutrinária em todos os pontos da teologia cristã, nenhum de nós seria salvo.
3 – Deus sempre
surpreende o Seu povo. É totalmente impossível antecipar as guinadas na
história da Igreja. Muito menos, fazer com que aconteçam. Há fatores em
operação que estão muito acima dos poderes humanos. Resta-nos ser fiéis à
Palavra de Deus, pregar o Evangelho completo – expositivamente, de preferência
– viver uma vida reta e santa, usar de todos os recursos lícitos para propagar
o Reino e plantar igrejas bíblicas e orar para que nosso Deus em 2012 seja
misericordioso com os seus eleitos, com a Sua igreja, com aqueles que Ele
predestinou antes da fundação do mundo e soberanamente chamou pela Sua graça,
pela pregação do Evangelho.
Extraído do blog: O Tempora, O Mores!
confesso que me sinto incapaz de prever o que vem pela frente?????????Olho para frente e não consigo perceber um padrão, uma indicação que seja, do futuro da igreja.
ResponderExcluirConfesso que não entendi que o autor deste texto é, pastor ou uma pessoa que prever futuro? Por que como ele o diz ele se sente incapaz de prever para 2012? confesso estou sem intender